sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Bagagens, malas e lembranças...

Dedico este texto a todos os meus amigos e à minha família! 

 Lembro-me de quando me despedia de minha madrinha, na minha infância. Todas as vezes que eu a visitava em São Luiz do Paraitinga, nos sítios ou em sua casa nova, depois que ela machucou a perna e não pôde mais cuidar dos animais, da fazenda e das montanhas que haviam em sua antiga casa. Eu, ao entrar no carro, depois dos vários abraços, sentia um nó na garganta, como se nunca mais a fosse ver novamente. Como se todos os momentos com ela tivessem um ponto final, e de verdade, nunca tiveram... 

 Eu acordava cedo pra tirar leite das vacas, ou buscar o gado com ela em lugares distantes, que para mim era uma aventura! Acendi fogueiras nas montanhas, brinquei de voar nas alturas, corri por lugares secretos na mata e descobri a natureza. Na minha mentalidade infantil, tudo aquilo era magia, fantasia, e estes momentos me moldaram, me levaram a acreditar que a natureza é bela, que os homens é que são intrusos, que toda a natureza já existia antes mesmo de nós!

 Daí que eu me sentisse tão triste por deixar a casa de minha madrinha, porque lá eu descobri tantos mistérios, vivi tantas aventuras e desenvolvi minha imaginação infantil de uma maneira tão saudável! Viver uma vida simples, próximo da natureza, em contato com um ar tão puro que jamais respirarei novamente, cuidar dos animais e me divertir sozinho nas montanhas, ouvir os rios e cachoeiras seguindo seu curso foi um aprendizado incrível.

 Viver de forma simples me seria tão mais aprazível que desejar a fama, os aplausos e o reconhecimento. Infelizmente, nesta minha vida, meu desejo sempre foi maior que minha imaginação. E quanto mais desejo, mais sofrimento experimento. Não é possível domar o desejo que em mim queima intensamente, é como tentar domar o fogo... Nós, humanos, demoramos para aprender a manuseá-lo, e ainda temos tanto que aprender com o fogo! O desejo é algo destruidor, apesar de construir inúmeros prédios, é ele também o culpado pela destruição de tudo que se constrói.

 Hoje, vejo diante de mim uma nova oportunidade. Um momento de aventurar-me por outros caminhos. De fato, isto já se me havia apresentado há mais tempo do que posso perceber agora. O movimento interno já me mostrava que, apoditicamente, eu teria de encarar novas situações, enfrentar meus piores medos e buscar algo maior, a liberdade.

 Agora compreendo efetivamente o quão pesado é este fardo, o quanto de moedas de sangue são necessárias para ser livre. Vejo, empiricamente, a selvageria que subjaz a liberdade. Mas é necessário que eu enfrente o novo, o diferente, porque já me cansei do mesmo!

 Depois de tanto tempo, sinto aquelas mesmas sensações de saudade que eu sentia quando me distanciava daquele lugar de aventuras em São Luiz do Paraitinga... Agora, entretanto, o sofrimento é bem maior, posto que meu desejo já não é mais o de uma criança. Desde aquela época, meu desejo se tornou muito mais visceral... daí que o caminho que se me apresenta hoje não seja tão urgente, mas vem de longa data! Tudo não passa de símbolos que me remetem à minha busca por sentido na vida... E, talvez, eu jamais o encontre...

 Talvez eu tenha mesmo que me acostumar a este processo de criar e destruir, criar e destruir. Nunca o mito de Sísifo se tornou tão significativo para mim! Apesar do sofrimento constante que experimento por vislumbrar a eterna construção e destruição de meus próprios esforços, estou feliz por poder construir algo diferente (sabendo que um dia poderei estar sujeito a uma nova destruição também...).

 E o que me dói é este nó na garganta, porém, muito mais forte que o de outrora! Agora, este nó na garganta está todo embebido em uma teia gigante de relações que fiz, de inúmeras pessoas que me fizeram bem e mal (ou que nada me fizeram), de família, de amigos, de amores e dissabores...

 Diz respeito à minha cidade, ao lugar que eu encontrei e onde fui encontrado, um complexo de paixões e ódio, de alegrias e tristezas. Acumulei uma pesada bagagem, e esta bagagem, fruto de "eu+minha circunstância", é que colaborou para eu me tornar quem sou agora e quem estarei sendo daqui pra frente! Portanto, não são apenas as malas com roupas e livros, incensos e velas, caveiras e piano que eu estou levando para Vinhedo, são todas estas relações das quais fui me moldando e moldando minha realidade. Fui influenciado e influenciei a muitos!

 As bagagens, então, não serão carregadas somente por mim, pois eu compartilhei várias delas com outras pessoas. E estas pessoas estarão ligadas a mim, por meio deste acúmulo mútuo de bagagens, até o fim da minha vida.

 Vejo, de certa forma epifânica, um lapso do meu futuro. E já sinto tanta saudades de tanta gente, lugares e momentos! É uma tortura! Escrevo esse texto com a intenção de demonstrar a todos que se relacionaram comigo, para que saibam que são marcas que fizeram na minha memória para sempre, que jamais me esquecerei de minhas raízes como muitas pessoas fazem, pensando ser fruto de si mesmos! Eu não sou fruto apenas de mim mesmo, não posso transar comigo mesmo (e como queria poder!).

 Sou um resultado de tantos fatores, e estes fatores são sempre humanos. Agradeço, então, a todos os meus mais preciosos amigos que me proporcionaram os bons momentos para compartilharmos a solidão de quem existe; e agradeço a todos os meus amáveis inimigos, que só se constituíram inimigos porque são capazes disso, portanto terão sempre meu respeito!

 Estou indo, mas estarei ficando na mente de muitos... E na minha mente há um poço sem fundo, onde "jogo" todos os que amo, rsrsrs!

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