quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Discurso para ampliamento do Espaço Entretenimentório


Este texto eu escrevi a todos os meus amigos antes de vir pra Vinhedo, onde estou morando agora.
Sabendo que nós, humanos, somos seres simbólicos, decidi utilizar um mito grego para escrever este discurso que estou pronunciando aos meus amigos, irmãos e irmãs.
Trata-se de um mito que eu encontrei há um bocado de tempo, em torno do qual eu construí grande parte do que sou hoje, no qual me inspirei e identifiquei características minhas e características de cada um de meu círculo “social”.
Algumas partes do que escrevo foram retiradas da internet, já que meus livros estão todos encaixotados, outras partes eu retirei das sínteses que eu mesmo fiz do que aprendi de meu grande amigo Nietzsche e do velho Heráclito!
Zeus era um deus safado e vivia pulando a cerca. Hera, sua esposa, apesar dos inúmeros chifres, sempre encontra um modo de “dar o troco”.  Ela era bem cruel nisso, mas Zeus não ajudava muito.
Certa feita, Zeus se transformou em uma serpente para conseguir transar com Perséfone (Zeus tinha esse problema com animais... E para cada mulher ele se mostrava de alguma forma diferente, ganso, cobra, ave... Se eu fosse mulher... Bom... Eu preferiria Zeus com um corpo de homem mesmo... Serpente, ganso... Não sei como elas sentiam tesão com isso!). Enfim, Zeus se transformou em uma serpente, afogou o ganso em Perséfone e nasceu um tal de Zagreu (não, não era Zaqueu, era ZaGREU). Hera ficou revoltadíssima e incitou os Titãs para que matassem Zaqueu... ZAGREU. Os titãs mutilaram Zagreu, comeram todas as partes do seu corpo, menos o coração, coração que Atenas salvou e levou até Zeus. Zeus fez uma poção com o coração de Zagreu e deu a uma mulher chamada Sêmele, a qual engravidou de Zeus.
Em apenas um parágrafo Zeus traiu Hera duas vezes! Como diria a Michilene: “Ele é booom”.
Hera ficou putíssima! Foi até Sêmele e disse a ela pra provar se Zeus era mesmo Zeus. “Ai, amigui, não sei, não, viu... Acho que esse bofe que te engravidou não é Zeus coisíssima nenhuma... Pede pra ele te dar uma prova de que é mesmo Zeus, boba... Fala pra ele aparecer pra você em forma de gente mesmo, quer dizer, de deus... Credo, fica aí te visitando em forma de animal... Vai saber se um dia desses ele vem em forma de ornitorrinco... eu hein!”
E assim, Sêmele pediu a Zeus que mostrasse quem ele realmente era. Ele arrancou a roupa, mostrou todos os músculos, raios e trovôes! Poder, sedução e magia, amigui! ARRASOOO! Só que daí ela morreu queimada no plano espiritual, virou cinza!
Zeus conseguiu salvar o filho de Sêmele que estava ainda vivo e costurou ele em sua coxa. Depois disso, nasceu Dionísio.
Dionísio foi o único deus do Olimpo que foi filho de uma mortal. Surgiu do meio do fogo. E concebido com o sangue do coração de um homem que morreu por vingança.
Dionísio é filho do fogo. O fogo é mudança contínua. Ao mesmo tempo que transformou sua mãe em cinza, deu à luz um deus. O fogo consome o oxigênio para poder arder, consome tudo à sua volta. Mas é também o fogo que proporciona calor, luz e que foi o maior descobrimento que o ser humano já fez.
Dionísio é o deus do caos, porque nasceu em meio a um tormento de relações, ciúmes e expectativas. Foi um deus adotado por uma nação que considerava bárbaro todos os que não falassem sua língua. Dionísio não era um deus tipicamente grego, era um deus de qualquer outro lugar, menos da Grécia, era um deus bárbaro, fora do padrão. Não estava no padrão, mas acabou por seduzir toda a Grécia, e depois Roma. Mulheres alucinadas que gritavam possuídas pelo deus, homens que esquartejavam animais e comiam suas carnes cruas, cidadãos que participavam de uma grande orgia ao ar livre, gritando “Io, Io, Bromios (o deus que troveja e grita loucamente), Io, io, Dendrites (o deus das árvores e da fertilidade)”
Dionísio não é apenas o deus do vinho e da alegria, é o deus do caos e da fertilidade, o deus dos loucos, dos que não se deixam aprisionar por padrões e sistemas, é o deus que seduz com a liberdade. E a liberdade, tenho descoberto isso pragmaticamente nos últimos dias, é uma mistura de angústia e satisfação, é uma junção de rupturas e novas construções.
Todos vocês estão aqui hoje, na casa da minha querida Cidinha Bronzatto, não são normais. Cada um de nós sofreu amargamente por perceberem que não fazem parte de alguma coisa, de algum grupo... Nós todos padecemos a mesma angústia, a angústia de não ter sentimento de pertencimento, de não ser de ninguém que não nós mesmos. Como disse o Fábio, nós compartilhamos solidão.
Escrevi este texto, porque eu encontrei um grupo de pessoas que, como eu, não sabem exatamente o seu lugar no mundo, pessoas que, assim como eu, sentem-se jogadas no mundo. Como se viéssemos de um útero que se transformou em cinzas e tendo sido criado nas coxas de um deus. Sentimos, aos mesmo tempo, que somos cinza, mas que temos algo dentro que é superior. Sim, nós somos espíritos superiores!
E nós construímos juntos um culto, um culto de mistérios, um culto a um deus que nos é semelhante... Que também sofreu das mesmas angústias. Um deus exilado, amado e odiado. Falando assim, até parece que estou falando de um outro deus... um que ficou pregado... Mas isso é apenas cópia, né? Não, eu estou falando de Dionísio, não confundam!
Sem perceber, nós louvamos o deus do vinho o tempo todo. Sem perceber, nós construímos um grupo. Sem perceber, nós nos tornamos sátiros e ninfas.
Sou muito grato a todos vocês, porque nós construímos juntos um sentimento de pertencimento. Sem pertencer a lugar algum, acabamos por pertencer a nós todos. E espero que nosso sentimento de união e pertencimento continue como o fogo que arde até se consumir por inteiro.
A Michilene já disse que nós não estamos indo embora, mas ampliando nosso espaços de divertimento. Eu acrescento que não estamos nos despedindo, estamos ampliando nosso culto a Dionísio!
Ao Bryan, meu irmão e companheiro; à Cidinha, que me ensinou a ser artista; ao Fábio, que me mostrou quão valioso eu sou, e por quem eu tenho tanta satisfação em ter conhecido; à Michilene, que foi iniciada nos nossos mistérios e se tornou fiel escudeira;  e a todos que estão aqui presentes (cita o nome, fedaputa!) – e ainda tem tanta gente a quem eu tenho que agradecer – eu agradeço por tudo o que vocês me proporcionaram. Pode ser que não dê certo em Vinhedo, e caso isso aconteça, sei que ainda terei meu lugar entre vocês. E caso dê certo, eu nunca vou me esquecer de ninguém e nós vamos continuar sendo esta família que somos, este bando de gente anormal e repleto de divertimento.
Amo todos vocês!