terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Somos agentes de nossa própria história!

Antes de refletir sobre quaisquer ações que possam sanar/minimizar a desvalorização do ser humano perante as socieades modernas, sinto necessidade de chamar Hobbes para me ajudar. Segundo Hobbes, a injustiça e a desigualdade entre os homens só aparece exatamente no momento em que os homens se unem para formar uma sociedade. Formando uma sociedade, com regras sociais e hierarquia é que surge também o elemento "poder".
Os seres humanos, então, na visão de Hobbes, se juntam em comunidade inicialmente por causa do medo da carnificina mútua, da violência constante da natureza e da total imprevisibilidade sob qualquer aspecto da vida.

A sociedade industrial afastou os indivíduos uns dos outros por meio da divisão do trabalho, da especialização e da técnica. Não há como separar, a forma de produção e de trabalho de cada sociedade influem diretamente nas relações sociais dos indivíduos.
As relações humanas estão totalmente embebidas dos ideais de mercado. Assim como as mercadorias não possuem mais uma história, também nós não temos direito a uma história. Somos também mercadorias nas prateleiras, temos rótulos e estamos expostos diante das empresas e/ou agências de emprego.
Uma mercadoria só se relaciona com a outra por meio de categorias de utilidade, preço e lucratividade. Também os homens são submetidos às mesmas normas. Já não somos indivíduos, somos "dividuos"...
Vivemos em comunidade, mas estamos todos afastados uns dos outros e nossas relações estão todas marcadas pela exploração do mercado.

Este afastamento mascarado nos desumaniza, pois é exatamente no contato com o outro que também podemos nos conhecer, conhecendo o outro conhecemo-nos a nós mesmos.

Parece, entretanto, que nossas mãos estão amarradas. E por mais que as aparências nos enganem, esta imagem não nos sai da mente, quer dizer, todas as ações realizadas, todas as práticas e atitudes direcionadas a tentativas de tornar o homem homem novamente, humano novamente, portador e sujeito de sua própria história... Parece que todas estas ações estão presas ao sistema de tal forma que não é possível pensar nada para além dele. Isto significa que por mais que nós odiemos o sistema, por mais que assumamos suas contradições e seus pontos negativos, ele está entranhado no nosso pensamento tão forte que não conseguimos pensar nada além do capitalismo ou fora dele. Isto é muito triste.

Resta, portanto, pensar ações dentro do capitalismo... É o mesmo que um escravo ter que reconhecer que jamais poderá ser livre e, por isso, deverá aceitar sua condição (condicionamento) de escravo e pensar modos de vida dentro de sua escravidão.

Que seja!

Nossas atitudes, então, deveriam ser canalizadas ao máximo para resgatar o contato direto com o outro, resgatar a alteridade, a interdependência dos sujeitos e suas histórias. Devemos buscar meios de tornar cada sujeito dono de sua própria história, providenciar os instrumentos corretos para que ele, com suas capacidades, possa transformar primeiramente seu próprio mundo e sua própria história. Quer dizer, devemos educar os individuos para que permaneçam como individuos, ou seja, não-reduzidos, não fragmentados, não-atomizados. E, penso eu (pensam também outros, acredito), a educação seja um dos poucos subterfúgios que temos ao alcance das mãos para mudar alguma ou pouca coisa na sociedade moderna. Mesmo que o resultado deste tipo de educação seja apenas o de fazer com que as pessoas se conscientizem de sua condição dentro do sistema. Apenas isso já é um grande passo.

Homens, hoje, são como elefantes presos a uma corrente. Os elefantes não sabem da força que possuem, por isso não arrebentam suas correntes...

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Gira-gira, mundo!

Acabei de olhar para o céu e encontrei uma grande amiga, a quem já não via fazia um bom tempo: a lua!
Deitei meu corpo no chão e permaneci extasiado, admirando, contemplando a lua, as estrelas e o grande lençol azul escuro acima de todos nós.

Eu me senti saudável, me senti bem, me senti sublimado.

Desde que o homem é homem, os olhos dos homens sempre se focaram para cima.
Parece que quase mais ninguém olha para o céu - pelo menos não param para apenas admirá-lo, apenas experimentar as suas cores, nuances, sombras e mistérios...

E, nós, que olhamos daqui, nós, os humanos, olhamos o céu e temos a impressão que ele está se movendo, mas somos nós que giramos sem perceber. E de quantos ângulos, então, podemos olhar o céu... Mas nenhum deles nós aproveitamos, simplesmente preferimos viver como porquinhos de cabeça para baixo.

Ouse olhar para o céu hoje ou amanhã apenas para se surpreender com a beleza, com o espaço.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Atitude Crítica e um negócico de nada de esperança!!!

Eu gosto desta palavra: CRISE.
“A origem filológica (etimológica, se preferir) dessa palavra provém do sânscrito, que é "KRI", e significa limpar, desembaraçar e purificar. Crisol e acrisolar guardam o sentido originário do sânscrito. De crise vem também "critério" que designa a medida pela qual dis-cri-minamos e separamos o autêntico do inautêntico”. (O que está entre aspas eu retirei de um texto que estudamos no 1° ano de filosofia, o autor é leonardo boff, mas perdi as referências do texto.)

As palavras criticar e crítica também estão relacionados a KRI. Por isso, uma pessoa que critica não é exatamente uma pessoa negativa, uma pessoa que se autodenomine crítica, deve ser alguém que saiba separar coisas, fazer cisões, possibilitar o questionamento. Criticar, seguindo neste contexto, não é “descer a lenha”. É óbvio que uma pessoa que age criticamente, na maioria das vezes, é considerada negativa, justamente por não concordar facilmente com tudo, por não aceitar qualquer tranqueira que empurrem “goela a baixo” Criticar é quase o mesmo que questionar, está mais para uma atitude semelhante a de um ourives mesmo, quer dizer, retirar de tal substância tais elementos para purificá-lo (não se interprete, porém “purificar” no sentido religioso.).
A crise, no seu sentido original tende a implicar mudança, ruptura, separação. Esse é seu significado mais acertado.

Podemos interpretar a crise de várias formas. Uma delas é a que está relacionada aos paradigmas construídos, quer dizer, os modelos, quando se tornam hegemônicos tendem sempre a entrar em crise, pois não dão conta de abarcar a mutação do tempo, não respondem mais às necessidades da época.
Crise, neste contexto, é um sinal de esgotamento de uma ordem (kosmos), de um conjunto de idéias, de um projeto social, de um conjunto de práticas, de um modo de ver, de um projeto existencial e até mesmo de uma ética, de valores morais aceitos até então.
As idéias, as teorias e as crenças são a base estrutural de um paradigma, logo, quando se entra em crise, o pensamento é a primeira estrutura a se romper, a sofrer a ruptura.

Falando em tempo estamos, por conseqüência, falando de crise, pois o tempo é um contínuo devir, um movimento de ser e deixar de ser. Quando se é, logo se deixa de ser, ou seja, o presente imediato é um instante absurdo que logo que surge também desaparece (e é exatamente neste presente imediato que a vida se configura).
A melhor comparação para o devir do tempo, da vida e também da nossa existência é o de Heráclito. Uma pessoa entra no rio em determinado lugar e molha seus pés na água, esta pessoa sai e volta depois para lavar os pés no rio de novo, mas ao entrar no rio, no mesmo lugar que antes, as águas já não são as mesmas. Tudo flui...

Todos nós seguimos um paradigma, um modelo que, querendo ou não, pode se tornar hegemônico. E logo que se torna hegemônico tende também a entrar em crise e precisa ser reformulado, às vezes destruído completamente para se criar coisa nova. A partir da crise que se experimenta, é que se pode tomar uma atitude, agir.

Chegamos à conclusão de que a crise em si mesma nunca é boa nem má, pois o que será bom ou mau é a ação que o sujeito tomará após a experimentação da crise. O que será julgado como bom ou mau são as suas escolhas.

Uma crise existencial é aquela que está ligada diretamente a questões básicas da existência humana, isto é, de onde viemos, por que viemos, para onde vamos ou se temos que ir mesmo pra algum lugar, se existe um sentido pronto (pré-dado) da vida, se somos nós os construtores do sentido da vida, da responsabilidade das nossas ações no mundo etc... (Aí vai uma lista imensa de coisas que se relacionam ao âmbito existencial)

Quando alguém entra em crise existencial, é por que ela se questionou, ou foi impelida a questionar-se sobre sua própria existência no mundo, seu significado no mundo.

Eu penso que este tipo de crise deveria ocorrer a todas as pessoas, pois somente através desta crise é que se conquista liberdade e autonomia de pensamento, é só assim que uma pessoa deixa de ser escrava das circunstâncias e começa a agir (práxis) com suas próprias ferramentas para mudar o ambiente ao seu redor e não apenas deixar-se entregue às suas influências.

Um homem ou mulher que sofreu a maravilhosa experiência de uma crise existencial consegue enxergar a vida de um modo mais saudável e não precisa apelar a subterfúgios exteriores para se ajudar ou para ser feliz.

Diante de uma crise nós também temos que fazê-la. Não é deus, nem sua mãe, pai, tio, tia, amigo, irmão, namorado ou namorada quem faz a escolha, todas as escolhas que dizem respeito à sua existência são apenas suas.

Por isso que se diz que existir é uma angústia, pois estamos entregues no abandono das nossas escolhas. Esta angústia, porém, não é uma angústia como entende o senso comum, é uma angústia que impele para o crescimento, é uma angústia apodítica, necessária para o desenvolvimento dos seres (se uma pessoa depois de viver uma crise não crescer, foi por que escolheu não crescer e a responsabilidade é toda sua, não há bodes expiatórios).

Não fosse assim, uma lagarta jamais se transformaria em borboleta, a não ser que ela superasse o momento daquela crise em seu casulo, apenas assim pode tornar-se nova criatura, novo ser.

Crise é algo inevitável para a perpetuação da vida, para a construção de novos conhecimentos, pois através da ruptura de um saber, de um conhecimento, de um paradigma é que se constroem novos saberes, novos conhecimentos, novos paradigmas.

Enfim, o grande desafio que temos na nossa existência é essa: "Torna-te naquilo que tu és!"

Desgraçados passarinhos!

(agora uma poesia pra zombar um pouco da seriedade gravíssima da vida!)

Toda poesia tem amor
dor, rancor, furor
rimas idiotas
palavras retorcidas
e passarinhos a voar!

Toda poesia
fala de saudade,
de maldade,
sexo, paixão
e de passarinhos.

E toda poesia
pra ser poesia
tem que ter nuvens,
sol brilhando,
lua cintilando,
estrelas piscando
e... passarinhos.

Se fala de mulher,
fala-se do seu cabelo,
de suas pernas,
de seu perfume,
de seus seios,
E lá estão os passarinhos
no meio de suas pernas!

Se fala da vida,
fala-se da rotina.
E a rotina do carro
é a estrada
A rotina da pele
é o arrepio
a rotina do poeta:
os passarinhos!

Desgraçados os passarinhos
Papagaios de piratas,
permeiam o tempo
no ombro dos poetas
cantarolando
a canção personificada do Mal!

Desgraçados os passarinhos
de cores incontáveis
dançando nos pedregais
zombando do rei,
assoviam para a rainha,
flertando com a princesa,
comendo sua...
a comida de todo dia!

Passarinhos revoltantes
pateticamente otimistas
irritantes como ovelhas
semelhantes às aranhas
infestando os cantos da parede
e dos poetas.

Graciosos, belos,
admiráveis obras na natureza,
quando se não tem insônia!

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

No Cemitério

O cemitério é uma cidade paralela, um lugar afastado, de certa forma, do movimento urbano, é um lugar ainda "sagrado" (talvez um dos últimos, talvez o único). No cemitério não se pode falar alto e, mesmo que eu não entenda isso (já que todos estão mortos!), mantenho o silêncio no cemitério.
Estando em silêncio, parece que me ligo aos demais presentes... Caminhando entre os túmulos, observando as faces das estátuas, as fotos dos falecidos, as flores dos familiares, as frases de saudade, só consigo ver uma coisa: Todos aqui, exceto eu e os coveiros, estão mortos!

Entre os mortos não há capitalismo, não há mercado, não há relações pessoais, não há romances, não há amizade.
Entre os vivos é que permanecem a memória dos que se foram, as amizades que deixaram, os romances que construiram.

E nós que estamos aqui, observando vocês, os mortos!? Demoraremos para participar do silêncio profundo?
É bem relativo...

Ninguém predeterminou os dias da nossa vida, podemos morrer com 60 anos, 100 anos, podemos morrer com 30 ou agora mesmo! Só quem irá somar os nossos dias são os que permanecerem vivos depois de mim, eles, sim, irão contar os meus dias.

Eu não escolho morrer, ninguém escolhe! Todos nós lutamos contra a morte, mas ela sempre vence no final, pois final é uma palavra diretamente ligada à morte!

Se depois do túmulo uma pessoa continua a viver, quer dizer, no céu, no inferno, numa outra dimensão, no paraíso da Alice ou seja lá onde for, então não se pode, sob aspecto algum falar em morte! Morte é mesmo um fim! Se alguém sobrevive depois do túmulo (ou, depois do corpo...) então significa que é imortal, ou seja, a-morte, in-morte, não-morte!

Sugiro que todos eles compareçam com mais frequência nos cemitérios, é tão simples... E tão assombroso ao mesmo tempo! Todos estão carregando o intenso fardo do destino, a saber, sua própria morte. E por mais que se recusem pensar este sombrio fato, não conseguem fugir da admirável força da velhice, da imprevisível tragicidade da natureza ou da atroz fúria de um acidente!

Não importa se vamos enxergar uma luz no fim do túnel, um trem, um avião, ou o nada! Até que se morra, todas as escolhas são nossas, todas as decisões são nossas, angústias, alegrias, tristezas ou prazeres somos nós quem experimentamos. O sentido da nossa vida está em nossas mãos, a responsabilidade de nos tornarmos o que quisermos é apenas nossa, não há como fugir da nossa liberdade!

E o mais interessante disso tudo é que toda vez que alguém morre a necessidade de encontrar uma causa ou uma razão para ela é uma lei. Quer dizer, ninguém pode morrer de "morte morrida", ou seja, ninguém pode morrer por morrer, ninguém deve apenas morrer. É preciso culpar alguém, é preciso justificar a morte, é preciso encontrar um porquê! Em um atestado de óbito (de vários que eu já li) raramente encontrará "morte natural". Não! 99% das mortes possuem uma justificativa!

No fundo, no fundo todos nós alimentamos ainda a desesperada idéia de imortalidade! Somos todos imorríveis! Tal pessoa só morreu por culpa de tal acidente! Fulano morreu por que fumou muito!

Qie DIABO! Fumando ou não, ela iria morrer; bebendo ou não, morreria também! De uma ou outra forma todos nós morreremos! E aí? O que faremos? Beberemos intensamente ou viveremos sobriamente? Quem decide isso é você exclusivamente! Ninguém pode decidir por você!
E é exatamente no momento das nossas escolhas é que vemos quão solitários somos, o quanto a existência humana é uma existência de abandono. Abandono, sim! Justamente por que nas suas escolhas, as escolhas são só suas, de mais ninguém! Encare os fatos, seja corajoso, fracos é que se resignam, fracos é que lamentam e se retraem!

Olhem os mortos! Eles estão tão... MORTOS! E você está tão vivo! E ainda reclama!? Viva! Escolha! Faça conforme seus princípios, assuma tua responsabilidade sobre tua própria vida! Seja forte!

"Morrer? Isso só acontece com o vizinho! Não, comigo não! Eu hein! Que absurdo!"

Morrer é quase que um crime! E de fato é, no caso de suicídio! Crime contra o Estado!!!
Ou seja, se você praticar suicídio, depois que terminar será culpado por isso! hahaha!

Seja como for, o cemitério é um dos lugares que apenas os que já perderam alguém visitam. O cemitério é um lugar que também só é visitado quando se tem um motivo. Caso contrário é um lugar detestável. E tanto é verdade que, por mais vagas que tenham, faltam pessoas para trabalharem no cemitério. É uma profissão vista com suspeita...

"Você trabalha no cemitério? Eu hein! O sangue de jesus tem poder!" - diz um crente.

"Você trabalha no cemitério? Eu hein! Cruz credo!" - diz um católico

"Você trabalha no cemitério? Eu hein! Cuidado com as energias negativas. - diz outro

Enfim, sou a favor de que as pessoas visitem o cemitério mais assiduamente, não apenas para "tomar café" com os seus mortos conhecidos, mas para refletir, para reconhecerem que são finitos, para aprenderem mais com os que já morreram, com os que podiam ser artistas, mas não foram; que podiam ser poetas, mas não foram; que podiam ser o que quisessem ser, mas não o foram!

Isso é tudo, pessoal!

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Os pianistas são solitários...

Mergulhei nos sons mais graves do piano para buscar neles uma identidade com a minha dor!

E à medida em que ressoavam os sons, me perdi numa espécie de vazio imenso e sem fim.
E me afoguei naquele sentimento, sem saber se era bom ou mau. E que importa se fosse bom ou mau? Importava apenas que fosse intenso.

E quanta intensidade naqueles sons tão sombrios que produzem os primeiros bordões, as primeiras cordas… os sustentáculos da minha alma tremiam!

Não quero pensar em nada agora…
Mesmo não sendo possível, ao menos quero tentar.
Quero tentar sentir somente e nada mais!

E se penso naquele instante, se reflito aquele momento meu, somente meu… Aquela magia acaba, esvai.

Por agora não quero refletir, não quero pensar, não quero questionar… Quero apenas sentir o som, esta materia que se torna imateria em mim!

Foda-se o sistema! Foda-se quem não concorda com minhas críticas! Foda-se a religião, que vive impondo o que devo ou não fazer! Foda-se você! Foda-se eu!

Deixe que esse momento seja só meu. Essa experiência é só minha!

Por um breve lapso de tempo… Eu imploro ao mundo e ao deus em quem não creio: Deixem-me sentir-me, deixem-me ser eu(mesmo sem saber que seja esse "eu" que eu mesmo desconheço), deixem-me ser livre, deixem-me em paz!
Estou repleto de Dionísio, quero o acaso, o não previsto, o ser-aí… e só!

Sutil e Soturno

Veio uma corda amordaçar-me…
Convergiu o sangue dos meus lábios
Na direção dos nove círculos infernais
Meu jardim tornou-se frio deserto noturno.

Galopando, então, no escuro vale
Como vento impetuoso o medo veio
E eu, trôpego de formol, caí do tempo.
Adaga maldita que dilacera a alma dos viventes!

Oh, gélida morte que tonteia,
Estou bêbado de teu cálice:
Vinho e narcóticos do além.

Nada aqui mais há
Que não seja cemiterial:
Fétidos perfumes
Carnes apodrecidas
Túmulos, lápides,
Corvos, aves de rapina
E todo verme rastejante…

No Hades, nada mais há
Que não seja sombra
Que não seja treva
Que não seja vazio de existência…

Aqui, apenas há um Nada… Eternamente!

Daniel Alabarce
Escrito para o Concerto Funerailles em: 18/05/2009

AMÉM!

Minha cabeça dói, meu estômago está todo revirado. Sinto os nós no intestino delgado, parecem cadarços de um tênis all-star - amarram e desamarram.

Minha língua seca na boca e meus olhos apodrecem em suas órbitas. Vagueiam vagabundos no nada, como os planetas sem direção!

Sim, meu estado já não é mais estado, agora é apenas mudança, nada há estável em mim!

E mesmo assim estou feliz! E tudo isso é uma grande contradição! Paradoxo de todos os paradoxos!

Como posso estar satisfeito e ao mesmo tempo sentir essa tão imensa angústia de existir?

Foda-se a moral da sociedade, eu sou mesmo um louco, um desvairado, um humano em busca de mais humanidade!
Pouco restou dos antigos costumes, da antiga moral… e sei que, a partir daqui, nada mais restará… senão lembranças mórbidas de saudades gélidas caindo como neve no Alasca!

Amém

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O Copo Sempre Meio Cheio!

A modernidade sofre uma crise profunda de sentidos, de ética, de solidez de costumes. Os indivíduos não acreditam mais em nenhuma instituição, nem no Estado e muito menos no outro.

Com o advento da ciência moderna, inúmeros dogmas, diversas afirmações cosmológicas, vários conhecimentos sobre a natureza, sobre o homem e sobre o Universo foram totalmente aniquiladas e destituídas de legitimidade.

Descobrir a imensidão do Universo, encontrar o poço do inconsciente no próprio homem, saber que se pode manipular os genes do homem, mudá-lo... São traumas bem grandes para a humanidade. As grandes guerras são apenas poeira perto de todos os "choques" pelos quais passamos...
E não está oculto a nenhum olho a conseqüência que estas desconstruções do conhecimento provocou.

Os indivíduos, atordoados, sentem agora que não há mais lugares metafísicos onde se segurarem, não há chão sólido na modernidade, ou como diz Zygmunt Bauman: a vida na modernidade é líquida.

Ninguém consegue mais ver a vida com as lentes embaçadas de antigamente, e por mais que se escondam (ou tentem fazer isso desesperadamente) atrás da religião, da própria filosofia ou do entretenimento no mundo capitalista... lá no fundo todos sentem o vazio da existência.

É bem provável que na Idade Média não existisse lugar para o vazio que sentimos atualmente, pois as pessoas viviam de forma muito diferente da nossa. (há possibilidade também que o vazio que eles sentissem fosse totalmente diferente do nosso )

Precisamos considerar que naquele tempo ainda havia um encantamento nas pessoas a respeito do planeta, das florestas, dos mares, do céu...(duendes, dragões, seres mágicos, fantasias e lendas) Tudo isso, até então, estava envolto de misticismos, de crenças religiosas. Na medida em que foram descobrindo novas terras, novos povos, novos costumes, se depararam com o diferente, com crenças totalmente estranhas. Agora era necessário um tipo de conhecimento mais sofisticado, mais amplo. A terra, o planeta, os mares, o céu aos poucos foram sendo dessacralizados, perderam seu encantamento, ficaram menores.

O próprio corpo do ser humano, envolto de tabus e preconceitos, agora começou a ser estudado pela ciência. (Homem máquina; quantificação da natureza; Descartes...) Todos estes acontecimentos históricos foram colaborando para que o niilismo se tornasse cada vez mais palpável. (e eu nem falei de Sócrates ou Platão... para não causar polêmica)...

Toda a humanidade está sentindo o poder do nada, a imensa influência que o nada pode causar nos indivíduos. Sejam filósofos ou não, o niilismo é uma realidade atual.

Todos constroem máscaras para esconder não só o que sentem e o que pensam, mas o que são mesmo. Esta máscara, produto de uma construção sócio-cultural, que todos denominam personalidade!


Não há como alguém não ver esta realidade concreta se se afastar um pouco da luz do cenário para olhar o todo, o grande “show” da humanidade. Qualquer pessoa verá este grande ridículo da sociedade, basta abrir bem os olhos.

Todos vivem como se Deus ainda fosse aquele refúgio eterno na hora da angústia; todos vivem demonstrado que são fortes quando não são, felizes quando são tristes, vivem uma contínua contradição. E quando alguém, de súbito, ousa demonstrar o que realmente sente e pensa, o que realmente é, é considerado louco, anti-ético, anti-social etc.

Na modernidade, todos estão vivendo uma grande farsa, uma enorme mentira, um grande teatro – se bem que os teatros costumam ser muito mais verossímeis. A vida, o agir, a ação do homem não condizem em nenhum aspecto com a realidade. Nosso teatrinho não “cola” mais, porém ninguém tem coragem de abandona-lo, pois sem esse teatrinho a vida não tem... SENTIDO!


E esse sentido é o único que sobrou, a saber, que representemos bem nossos papéis, cada um conforme o que mandam aqueles grandes edifícios ontológico-metafísicos : As Teias de aranhas...


O primeiro passo a se dar seria o de reconhecer esta condição em que vivemos, assumir que a vida, tal como foi se construindo, está totalmente vazia, caída no “nada”, no nihil. Somente com este primeiro passo seria possível pensar e construir novos sentidos.

Estes novos sentidos precisariam se construir fundamentados, de certa forma, em ideais mais flexíveis, posto que, após o niilismo, todas as noções de absoluto definharam. É preciso construir uma ética mutável, uma ética que não seja rígida e que possa se transformar de acordo com a realidade. Até agora tentamos encaixar os princípios éticos antigos na atualidade (coisa tal embebida de absurdidade infinita). Precisamos construir uma nova ética, uma ética que esteja em relação positiva com o devir...

De modo que o copo sempre esteja MEIO-CHEIO!................


Daniel Alabarce