quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

No Cemitério

O cemitério é uma cidade paralela, um lugar afastado, de certa forma, do movimento urbano, é um lugar ainda "sagrado" (talvez um dos últimos, talvez o único). No cemitério não se pode falar alto e, mesmo que eu não entenda isso (já que todos estão mortos!), mantenho o silêncio no cemitério.
Estando em silêncio, parece que me ligo aos demais presentes... Caminhando entre os túmulos, observando as faces das estátuas, as fotos dos falecidos, as flores dos familiares, as frases de saudade, só consigo ver uma coisa: Todos aqui, exceto eu e os coveiros, estão mortos!

Entre os mortos não há capitalismo, não há mercado, não há relações pessoais, não há romances, não há amizade.
Entre os vivos é que permanecem a memória dos que se foram, as amizades que deixaram, os romances que construiram.

E nós que estamos aqui, observando vocês, os mortos!? Demoraremos para participar do silêncio profundo?
É bem relativo...

Ninguém predeterminou os dias da nossa vida, podemos morrer com 60 anos, 100 anos, podemos morrer com 30 ou agora mesmo! Só quem irá somar os nossos dias são os que permanecerem vivos depois de mim, eles, sim, irão contar os meus dias.

Eu não escolho morrer, ninguém escolhe! Todos nós lutamos contra a morte, mas ela sempre vence no final, pois final é uma palavra diretamente ligada à morte!

Se depois do túmulo uma pessoa continua a viver, quer dizer, no céu, no inferno, numa outra dimensão, no paraíso da Alice ou seja lá onde for, então não se pode, sob aspecto algum falar em morte! Morte é mesmo um fim! Se alguém sobrevive depois do túmulo (ou, depois do corpo...) então significa que é imortal, ou seja, a-morte, in-morte, não-morte!

Sugiro que todos eles compareçam com mais frequência nos cemitérios, é tão simples... E tão assombroso ao mesmo tempo! Todos estão carregando o intenso fardo do destino, a saber, sua própria morte. E por mais que se recusem pensar este sombrio fato, não conseguem fugir da admirável força da velhice, da imprevisível tragicidade da natureza ou da atroz fúria de um acidente!

Não importa se vamos enxergar uma luz no fim do túnel, um trem, um avião, ou o nada! Até que se morra, todas as escolhas são nossas, todas as decisões são nossas, angústias, alegrias, tristezas ou prazeres somos nós quem experimentamos. O sentido da nossa vida está em nossas mãos, a responsabilidade de nos tornarmos o que quisermos é apenas nossa, não há como fugir da nossa liberdade!

E o mais interessante disso tudo é que toda vez que alguém morre a necessidade de encontrar uma causa ou uma razão para ela é uma lei. Quer dizer, ninguém pode morrer de "morte morrida", ou seja, ninguém pode morrer por morrer, ninguém deve apenas morrer. É preciso culpar alguém, é preciso justificar a morte, é preciso encontrar um porquê! Em um atestado de óbito (de vários que eu já li) raramente encontrará "morte natural". Não! 99% das mortes possuem uma justificativa!

No fundo, no fundo todos nós alimentamos ainda a desesperada idéia de imortalidade! Somos todos imorríveis! Tal pessoa só morreu por culpa de tal acidente! Fulano morreu por que fumou muito!

Qie DIABO! Fumando ou não, ela iria morrer; bebendo ou não, morreria também! De uma ou outra forma todos nós morreremos! E aí? O que faremos? Beberemos intensamente ou viveremos sobriamente? Quem decide isso é você exclusivamente! Ninguém pode decidir por você!
E é exatamente no momento das nossas escolhas é que vemos quão solitários somos, o quanto a existência humana é uma existência de abandono. Abandono, sim! Justamente por que nas suas escolhas, as escolhas são só suas, de mais ninguém! Encare os fatos, seja corajoso, fracos é que se resignam, fracos é que lamentam e se retraem!

Olhem os mortos! Eles estão tão... MORTOS! E você está tão vivo! E ainda reclama!? Viva! Escolha! Faça conforme seus princípios, assuma tua responsabilidade sobre tua própria vida! Seja forte!

"Morrer? Isso só acontece com o vizinho! Não, comigo não! Eu hein! Que absurdo!"

Morrer é quase que um crime! E de fato é, no caso de suicídio! Crime contra o Estado!!!
Ou seja, se você praticar suicídio, depois que terminar será culpado por isso! hahaha!

Seja como for, o cemitério é um dos lugares que apenas os que já perderam alguém visitam. O cemitério é um lugar que também só é visitado quando se tem um motivo. Caso contrário é um lugar detestável. E tanto é verdade que, por mais vagas que tenham, faltam pessoas para trabalharem no cemitério. É uma profissão vista com suspeita...

"Você trabalha no cemitério? Eu hein! O sangue de jesus tem poder!" - diz um crente.

"Você trabalha no cemitério? Eu hein! Cruz credo!" - diz um católico

"Você trabalha no cemitério? Eu hein! Cuidado com as energias negativas. - diz outro

Enfim, sou a favor de que as pessoas visitem o cemitério mais assiduamente, não apenas para "tomar café" com os seus mortos conhecidos, mas para refletir, para reconhecerem que são finitos, para aprenderem mais com os que já morreram, com os que podiam ser artistas, mas não foram; que podiam ser poetas, mas não foram; que podiam ser o que quisessem ser, mas não o foram!

Isso é tudo, pessoal!

2 comentários:

  1. Boa idéia! Vou abrir um parque no cemitério perto da minha casa, acho q assim os mortos podem dar algum lucro! rsrs (desculpe, pensei e não aguentei. rsrsrs)
    Teve um tempo q eu visitava mais o cemitério, mas parece não ter surtido muito efeito em mim.
    Um abraço!

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  2. só o paulo mesmo hein!

    Bem que eu gostaria mesmo que o cemitério fosse um lugar onde as pessoas pudessem frequentar ate mesmo para lazer, por que não? Esse seria um primeiro passo a se dar em direção à um relação mais saudável com a finitude humana...

    O nome do parque seria: "Amiguinhos da morte"!

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