quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Uma Carta...

A Carta:
Sonho, morte ou realidade?

“Para quem interessar”:

Não sei que dia é hoje, nem que horas devem ser ao certo. Sei que estou aqui, que estou respirando, vendo pessoas ao meu redor, ouvindo diversos timbres de vários instrumentos, e percebendo diferenças entre os sons musicais e o som das diversas vozes a conversar. Sei isto, por que meus sentidos enviam isto ao meu cérebro. Por alguma razão que desconheço eu acredito piamente que tudo é verdade. Talvez por tudo ter sido exatamente desta maneira desde que me recordo, desde que me conheço por gente: sinto, portanto existo!
Hoje, penso, parece um dia como qualquer outro: as gotas de chuva caem com leveza delicada sobre a terra, e esta exala um odor úmido e único. Mas há uma exceção, há uma fagulha de desconfiança que paira sobre a mente… E é justo a minha, a minha mente, como sempre, claro!

Não sei… Todavia… algo dentro de mim persiste em repetir uma mensagem, pelo menos é o que eu creio ser: uma mensagem. Como se em mim vivesse outro “eu”, um outro ser dentro de mim. Pode ser uma frase, um ideal, um conceito ou simplesmente… Uma mensagem. Pra ser sincero eu mesmo não consigo discernir, mas com freqüência estas estranhezas me ocorrem.

Este “outro eu” me desvendou um outro lado de tudo, um detalhe que eu ainda não percebera: “Porventura… Se… Será… que todos nós não estamos vivendo numa eterna e contínua utopia? Será que a vida, a morte… nós mesmos… não passamos de um breve sonho e na pior das hipóteses: um pesadelo?”.
Quando eu ainda era muito pequeno (apesar de que ainda o sou na estatura física), sempre, ao olhar o céu estrelado durante a noite, ficava imaginando se tinha possibilidade de existir outro ser, idêntico a mim, tanto na personalidade, quanto no temperamento, mas que reagisse de outra forma diante das mesmas circunstâncias que eu enfrentei aqui.

Talvez em um dos muitos planetas, universos ou galáxias o meu “eu verdadeiro” estivesse vivendo.

Fico observando como minha mente viaja tão longe, e perscruta idéias tão absurdas!
Se bem que agora, crescido e adulto, posso dizer que, na realidade, nada é mais absurdo do que a própria vida (e se este termo será levado para o bom ou o mal sentido, vai de cada um). Tanto as ilusões nas quais acredita uma criança, quanto as inúmeras idiotices gigantescas e grosseiramente loucas que nós, adultos, defendemos são um completo absurdo.
O problema é que… Se estes meus pensamentos são verdadeiros, (e temo extremamente por isso): que tudo e todos são apenas sonho…
Ponho-me em um divã (em verdade coloco este “eu” no divã) e pergunto a mim mesmo: se tudo é um sonho (ou um pesadelo), é certo que em algum lugar eu, no caso o meu “eu verdadeiro” esteja dormindo, ou talvez em coma, ou ainda esteja passando por uma experiência de “quase-morte”.Caso seja assim… Todos os meus vinte e cinco anos, minhas lembranças boas e más, meus amigos e inimigos não passam de montagens abstratas e randômicas do cérebro deste “eu verdadeiro” sobre a realidade verdadeira (já que a minha realidade é o sonho) enfrentada por ele, e que no momento está dormindo.

Uma coisa pelo menos me consola se estas loucuras forem verdade: posso confiar que nada deste sonho foi inventado, apenas modificado sem uma ordem prévia.

É complicado explicar isso pra você, pois eu nem sei quem você é e como está reagindo a esta carta. No entanto, eu escolhi você. Vai que eu tenha morrido e você esta lendo esta carta por que o destino quer que você me ajude a encontrar a luz? (…) Estou brincando, seu idiota!
Minhas pálpebras não se unem, e quando, vez por outra, isso acontece, logo os pulmões gritam e perdem o ar. Quando o pulmão está tranqüilo, o coração entra na era contemporânea musical, e sai do ritmo, sai do compasso, quebra o padrão. Vou me esvaindo, caindo em nenhuma direção.

Pense bem: como é que os homens podem afirmar que em um ponto determinado da Terra é o Norte, e em outro é o Sul (que uma parte é o alto, e outro é o baixo) se a Terra é redonda, e a uma circunferência não se encontra lado algum? E ainda: Como eles podem ter certeza que o Norte é para cima, se não sabemos onde é o teto do Universo? É exatamente por este motivo que eu caio indo pra lugar nenhum, por que eu não sei qual é o lugar de algo, ou se há mesmo um lugar!
Você está me compreendendo? (…) Não, né?
Bom, minha cabeça está estourando, não por estas questões complicadas, mas por sono mesmo. Estou com medo de dormir! E se na verdade o meu “eu verdadeiro” é quem está dormindo, e em seu sonho eu aqui estou sentindo sono só por que no sonho dele ele quer que seja desta forma? Concluo que todas as minhas necessidades não passam puramente de um sonho, e por isso são irreais. Posso, então, ficar sem dormir? Certamente que não, pois se eu agir assim vou adoecer. E adoecer também é um sonho! E morrer? Morrer? Morrer também é um sonho, oras! Só que se eu morrer no sonho do meu “eu verdadeiro”, nem por isso meu “eu verdadeiro” terá deixado de viver! Então ele tornará a me trazer à vida (mesmo que esta também seja um sonho) para me fazer viver novamente todas estas maravilhas (no pior sentido da palavra).

Apesar de não ter certeza de tudo (o que é muito anormal) disto eu não duvido: em algum lugar, sonhando ou não, eu, ou o meu “eu verdadeiro” estou (á) vivo.

Isso não muda nada. Não me afeta em nada.

Hã? Se afeta meu “eu verdadeiro”? Aí eu não sei. Você teria que perguntar para ele!

-Pode falar… Sim… Entendo…

Pois, que seja… Se tudo isso for realidade… A conclusão pode seguir dois caminhos,

primeira: eu estou realmente sem nada para fazer de proveitoso. Ou,

segundo: Eu estou realmente lesado e desequilibrado.

Mas o que importa? Eu duvido que exista alguém no mundo, vivo ou não, que possa afirmar alguma coisa acerca desta vida de interrogações.

Então… Qualquer tese, qualquer hipótese e teoria devem ser consideradas dignas de algum aprofundamento, inclusive esta minha tese absurda!

Tchau!
Daniel Vieira de Carvalho
09/04/2008

Um comentário:

  1. Olá Daniel! Ou será Descartes? Bem o nome não importa.

    Não considero suas palavras, sua tese, absurdas pelo contrário, adoro o que você escreve porque apesar de sermos bem diferentes, você consegue me transportar para dentro dos seus textos que são cheios de significados e profundidade e você sabe por quê? Porque você tem a coragem de escrever sobre o que de fato te inquieta e isso faz com que seus textos tenham vida.
    Creio que a existência humana é algo inquietante e causa muitas dúvidas e incertezas. O fato de não termos certeza de muita coisa, para não dizer que não temos certeza de nada, causa medo e insegurança e por isso por vezes fugimos do questionamento sobre essa tal de existência. Queremos controlar tudo, quando não podemos controlar nem nossa própria vida (quando nascer e morrer e muitas outras coisas), mas será que essa ausência de controle é tão ruim assim? Sinceramente eu acho que não.
    Uma vez um amigo perdeu um ente querido e eu lhe disse que às vezes ser forte é admitir as próprias fraquezas e creio que nos seres humanos somos muito fracos, não conseguimos nos encarar e nos darmos conta de que somos apenas um flash que acende e apaga rapidamente, seres com potencialidades, mas não onipotentes, mas por isso nossa existência é insignificante? Creio que não, a vida nos oferece muitas oportunidade a cada dia, a cada hora, a cada minuto e segundo, mas também temos que nos deparar com nossas impossibilidades e foi delas que queria falar nesse comentário.
    Você mergulhou nas suas dúvidas e enfrentou-as de frente, mostrando até mesmo essa impotência que sente diante da vida e eu te admiro por isso.

    Bjo e comenta no meu blog: http://tudoaquivaimerevelar.blogspot.com/

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