De repente... Um garoto de treze anos comprando heroína pra
sua mãe que estava ocupada demais com sua orgia particular. Era seu aniversário, mas
não dava para contar as velas do bolo, pois não havia bolo e ele fez, como
parte da tradição, um pedido, inocente pedido que terminou por se
realizar. De repente... Uma mulher ali na cama, usando heroína, acaba de morrer
de overdose e, de repente, um garoto está sozinho, completamente jogado à sua
própria sorte, a metáfora do presente mais precioso que lhe poderiam oferecer: o destino.
Um garoto como esse jamais seria como um garoto qualquer que joga, que
brinca, que corre. Para sobreviver a única coisa que tinha era seu próprio
corpo, e a única referência era sua mãe.
A história tecida em Jet Boy é a história de muitos garotos anônimos e de
muitos adultos que foram obrigados, na infância, a sacrificarem seu próprio
direito de sorrir por sua subsistência num mundo cruel e traiçoeiro como o
nosso.
Como todo bom filme, e como toda boa obra de arte, precisamos de uma
catarse, de hybris, necessitamos ver
a realidade pintada, a verdade transeunte que é purificada pelas máscaras
dionisíacas, o véu que encobre sem jamais esconder totalmente, a sutil nuance
de sombra que transforma a vida trágica em drama existencial que procura sempre
resgatar nosso olhar objetivo e decepcionado com o peso sufocante de estarmos
todos jogados no palco e cutucar, com certa audácia, as nossas costelas a fim
de encontrar algum riso, mesmo que forçado, ou alguma esperança, mesmo que
amarela.
Temos a arte para não morrer da verdade, diria Nietzsche, o velho. E com
tamanha maestria não poderia dizer melhor.
Após ter perdido sua mãe, Nathan passa a correr em direção ao oeste, mas
acaba encontrando um companheiro de estrada indo para o leste e passa a descobrir a figura de um pai que nunca teve em um
estranho que nunca havia visto antes, igualmente perdido em suas próprias
crises, igualmente carregado de cicatrizes, mas igualmente solitário e correndo
em alguma direção.
A vontade é sempre vontade de vida, mesmo a pulsão de morte é só a outra
face da mesma moeda que pede, que implora por ascender, que luta pelo desejo irracional
que o impele para cima, a força, o poder que ultrapassa o limite do absurdo,
dos abismos, aquilo que insiste em estender a corda, construir pontes e ir
além...
Filme: Jet
Boy
Direção:
David Schultz
Produção: Nancy Laing
Música: Byron Foster / Greg Graffin
Fotografia: Brian Whittred
País: Canadá
Ano: 2001
Gênero: Drama
Ótima critica ao filme.
ResponderExcluirEnfase em citação: "A vontade é sempre vontade de vida, mesmo a pulsão de morte é só a outra face da mesma moeda que pede, que implora por ascender, que luta pelo desejo irracional que o impele para cima[...]"
abç
Somos movidos pela vontade - um sentimento que nos leva a agir, assumir riscos e conquistar objetivos. Mas essa vontade é apenas uma parte de um ciclo inescapável de desilusões: dela vamos ao sucesso, então à frustração - e a uma nova vontade...Salve Schopenhauer !
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